Legal Flash

18/03/24

Novidades legislativas e jurisprudenciais

Novidades legislativas e jurisprudenciais
26 de fevereiro a 8 de março de 2024

A inconstitucionalidade do Adicional de Solidariedade Sobre o Sector Bancário declarada pelo Tribunal Constitucional, identificação dos elementos instrutórios dos procedimentos previstos no RJUE e outros temas

Contencioso Tributário

1.Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 149/2024 – A inconstitucionalidade do Adicional de Solidariedade Sobre o Sector Bancário por violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal

Conforme oportunamente divulgado, a jurisprudência arbitral tem-se pronunciado no sentido da inconstitucionalidade do regime do Adicional de Solidariedade Sobre o Setor Bancário (“ASSB”).

No final do ano de 2023, o Tribunal de Justiça da União Europeia, (“TJUE”), seguindo as conclusões do Advogado Geral esclareceu ser o regime do ASSB incompatível com o Direito da União Europeia –, na medida em que a norma de incidência, ao permitir somente a alguns sujeitos passivos de ASSB (as entidades residentes e as filiais de entidades não residentes) a dedução de elementos do seu passivo à base de incidência deste tributo, vedando tal possibilidade a outros sujeitos passivos (designadamente, às sucursais de entidades não residentes), consubstancia uma violação da liberdade europeia de estabelecimento.

Neste contexto, no passado dia 27 de fevereiro de 2024, o Tribunal Constitucional (“TC”) pronunciou-se sobre a conformidade constitucional do ASSB. Na sua fundamentação, o TC começa por apreciar a natureza jurídica deste tributo, concluindo pela sua qualificação como um verdadeiro imposto. Seguidamente, o TC, ao concluir conter o regime do ASSB – que entrou em vigor a meio do ano de 2020 – normas que estabeleciam que liquidação deste imposto se fazia por referência aos dois semestres daquele ano, julgou inconstitucionais tais normas por violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (“CRP”). O acórdão pode ser consultado na íntegra aqui.

Note-se que esta argumentação do TC apenas é aplicável às liquidações de ASSB referentes ao ano de 2020, na medida em que a retroatividade do regime do ASSB não se verifica nos anos subsequentes. Não obstante, subsistem os demais fundamentos de inconstitucionalidade avançados pela jurisprudência arbitral, bem como a incompatibilidade de tal legislação com o Direito da União Europeia, já reconhecida pelo TJUE.

→ Para mais informações contactar: sonia.f.martins@ccrlegal.pt

Público

1.Portaria n.º 71-A/2024, de 27 de fevereiro - Identifica os elementos instrutórios dos procedimentos previstos no Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (“RJUE”) e revoga a Portaria n.º 113/2015, de 22 de abril

O legislador, com a presente portaria, prevê a possibilidade da entrega dos projetos, estudos e termos de responsabilidade que permitam promover uma adequada fiscalização das operações urbanísticas e sirvam de garantia de qualidade e segurança aos diversos intervenientes. 

Pretende-se a clarificação de quais os elementos instrutórios aplicáveis ao controlo urbanístico prévio de obras de centros electroprodutores de fontes de energia renovável, em concreto solar e eólica, bem como a instalação de armazenamento de energia, com vista a dar cumprimento a um dos marcos da reforma RP-C21-r48 (Simplificação do quadro jurídico e regulamentar aplicável aos projetos de energias renováveis, do Plano de Recuperação e Resiliência).

O diploma pode ser consultado na íntegra aqui.

2.Portaria n.º 71-B/2024, de 27 de fevereiro - Aprova os modelos de utilização obrigatória de licença, de resposta à comunicação prévia, dos atos a praticar pelos técnicos e dos modelos de avisos de publicitação de operações urbanísticas, nos termos do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (“RJUE”)

O Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro, veio introduzir um conjunto de alterações ao Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, na sua redação atual, que estabelece o RJUE, no sentido da reforma e simplificação dos procedimentos no âmbito do urbanismo e do ordenamento do território - Simplex do Urbanismo.

Tendo em conta as alterações introduzidas, procede-se à revisão dos modelos, em vigor, de licença e de comunicação prévia das operações de loteamento, de urbanização, de edificação, de demolição, de remodelação de terrenos e de outras operações urbanísticas.

Adicionalmente, a presente Portaria introduz igualmente os modelos de resposta à comunicação de utilização e à comunicação prévia de utilização com prazo, consoante essa comunicação seja, ou não, apresentada após a realização de operação urbanística sujeita a controlo prévio. Procede-se, ainda, à revisão dos modelos de aviso para publicitação de diferentes operações urbanísticas.

O diploma pode ser consultado na íntegra aqui.

3.Portaria n.º 71-C/2024, de 27 de fevereiro - Procede à primeira alteração da Portaria n.º 1268/2008, de 6 de novembro, que define o modelo e requisitos do livro de obra e fixa as características do livro de obra eletrónico

O Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro, que procedeu à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo e ordenamento do território, veio alterar o Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (“RJUE”), em concreto, o artigo 97.º, no sentido de não considerar o livro de obra como um elemento instrutório do pedido de licença ou comunicação, não devendo ser remetido para a câmara municipal no final da obra, nem sujeitá-lo a qualquer análise prévia, registo, validação ou termo de abertura ou encerramento por parte de entidades públicas.

Neste sentido, a presente portaria vem estabelecer que o livro de obra digital é elaborado na Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos (“PEPU”), nos termos previstos no artigo 8.º-A do RJUE, na sua redação atual, incorporando, com as necessárias adaptações, os requisitos funcionais que permitam cumprir as finalidades do livro de obra com maior conveniência, simplicidade, transparência e segurança.

Com a disponibilização do livro de obra na plataforma eletrónica referida no número anterior, deixa de ser admissível a sua utilização em formato de papel nas obras que tenham início após essa data.

O diploma pode ser consultado na íntegra aqui.

4.Lei n.º 29/2024, de 5 de março - Define o regime de regularização dos edifícios-sedes e similares das associações sem fins lucrativos

A presente Lei vem estabelecer, com caráter extraordinário, o regime regularização dos edifícios-sedes e similares de associações sem fins lucrativos, existentes à data da sua entrada em vigor, que não disponham de título urbanístico ou de licenciamento, incluindo as situações de desconformidade com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares ou com servidões administrativas e restrições de utilidade pública.

Adicionalmente, também estabelece o regime a aplicar à alteração ou ampliação das instalações-sedes ou similares que possuam licença de utilização válida e eficaz, cuja alteração ou ampliação não seja compatível com os instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares ou com servidões e restrições de utilidade pública.

Consideram-se edifícios-sedes, os espaços de convívio, os recintos desportivos e culturais e similares das associações sem fins lucrativos, dispondo estes de três anos a contar da data da entrada em vigor da presente lei para apresentar pedido de regularização, alteração ou ampliação.

O diploma pode ser consultado na íntegra aqui.

5.Lei Orgânica n.º 1/2024, de 5 de março - Altera a Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprova a Lei da Nacionalidade

A presente Lei estabelece que o tempo decorrido desde o pedido da autorização de residência também deve ser tido em consideração no cálculo do período de 5 anos exigido para o pedido de nacionalidade, ao invés da data da emissão do primeiro cartão.

O diploma pode ser consultado na íntegra aqui.

6.Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 7 de março, Processo C-604/22 - Define o que se deve entender por dados pessoais e responsável pelo tratamento, para efeitos do artigo 4.º do Regulamento sobre a Proteção de Dados Pessoais

No presente Acórdão questiona-se se o número 1 do artigo 4.° do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”) - que define o que são dados pessoais - deve ser interpretado no sentido de que uma cadeia composta por uma combinação de letras e de carateres, como a TC String, que contém as preferências de um utilizador de Internet ou de uma aplicação relativas ao consentimento desse utilizador para o tratamento dos dados pessoais que lhe dizem respeito por fornecedores de sítios de Internet ou de aplicações, bem como por intermediários desses dados e por plataformas publicitárias, constitui um dado pessoal na aceção desta disposição, quando uma organização setorial tenha estabelecido o quadro de regras segundo o qual essa cadeia deve ser gerada, armazenada ou difundida e os membros dessa organização aplicaram essas regras e têm, assim, acesso à referida cadeia.

O Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) entendeu que “mesmo que uma TC String não contenha, em si mesma, elementos que permitam a identificação direta da pessoa em causa, não deixa de ser certo, em primeiro lugar, que ela contém as preferências individuais de um utilizador específico quanto ao seu consentimento para o tratamento dos dados pessoais que lhe dizem respeito, sendo essa informação «relativa a uma pessoa singular», na aceção do artigo 4.°, ponto 1, do RGPD.”

Aliás, refere ainda o TJUE que “(...) quando as informações contidas numa TC String estão associadas a um identificador, como, designadamente, o endereço IP do aparelho desse utilizador, podem permitir criar um perfil do referido utilizador e identificar efetivamente a pessoa concreta a quem essas informações dizem respeito.

Ademais, questiona-se ao TJUE se o número 7 do artigo 4.° do RGPD - que define o que se deve entender por responsável pelo tratamento - deve ser entendido no sentido de uma organização setorial, na medida em que propõe aos seus membros um quadro de regras por si estabelecido relativo ao consentimento em matéria de tratamento de dados pessoais, que contém não só regras técnicas vinculativas mas também regras que especificam de forma detalhada as modalidades de armazenamento e de difusão dos dados pessoais relativos a esse consentimento, deve ser qualificada como responsável pelo tratamento nos termos do RGPD.

O TJUE, em resposta, defende que uma pessoa singular ou coletiva só pode ser considerada responsável conjunto pelas operações de tratamento de dados pessoais se determinar conjuntamente as respetivas finalidades e meios. Consequentemente, e sem prejuízo de uma eventual responsabilidade civil prevista no direito nacional a esse respeito, essa pessoa singular ou coletiva não pode ser considerada responsável, na aceção da referida disposição, por operações anteriores ou posteriores da cadeia de tratamento cujas finalidades e meios não são por ela determinados.

Assim, entende o TJUE que “uma organização setorial, só pode ser considerada responsável por esses tratamentos posteriores quando se demonstre que influenciou a determinação das finalidades e das modalidades destes tratamentos, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar à luz de todas as circunstâncias pertinentes do processo principal.”

O Acórdão pode ser consultado na íntegra aqui.

7.Conclusões de Advogado-Geral do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 7 de março, Processo C-652/22 - Possibilidade de um proponente apresentar provas adicionais relativas às suas habilitações técnicas e profissionais após o termo do prazo de apresentação das propostas

O pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal Administrativo de Recurso da Croácia dá ao Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) a oportunidade de clarificar as circunstâncias em que, após o termo do prazo para a apresentação de propostas, as entidades adjudicantes podem solicitar correções ou esclarecimentos aos proponentes.

Ademais, o TJUE deve responder a duas questões. Os operadores económicos estabelecidos em países terceiros com os quais a União Europeia não celebrou um acordo internacional sobre contratos públicos têm o direito de participar em processos de adjudicação de contratos públicos na União Europeia? Em caso afirmativo, podem os Estados‑Membros determinar as condições em que esses operadores o podem fazer ou trata‑se de uma matéria da competência exclusiva da União Europeia?

Quanto à participação de operadores económicos de países terceiros não abrangidos em procedimentos de contratação pública na União Europeia, o Advogado-Geral considerou que os operadores económicos de países terceiros não abrangidos não se inserem no âmbito de aplicação ratione personae da Diretiva 2014/25. Assim, tendo em consideração que a recorrente não pode participar num procedimento de adjudicação de um contrato público regido pela Diretiva 2014/25, não pode também pretender invocar as suas disposições perante um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro.

Quanto à competência para regulamentar a participação de operadores económicos de países terceiros em procedimentos de contratação na União Europeia, os Estados‑Membros não estão autorizados a adotar legislação numa área da competência exclusiva da União, a menos que visem transpor o direito da União ou que a União os tenha habilitado a fazê‑lo.

Considerando que a União Europeia não parece ter exercido a sua competência exclusiva para determinar o acesso dos operadores económicos de países terceiros não abrangidos aos procedimentos de adjudicação de contratos públicos, os Estados‑Membros que pretendam tomar medidas para esse efeito podem informar as instituições competentes da União da sua proposta de linha de ação, com vista a obter a autorização necessária.

A ação unilateral dos Estados‑Membros poderia prejudicar a posição negocial da União no contexto dos seus esforços para abrir, numa base de reciprocidade, os mercados de contratos públicos de países terceiros, bem como interferir na aplicação uniforme do direito da União, uma vez que, em tais circunstâncias, a aplicação da Diretiva 2014/25 ratione personae poderia variar de um Estado‑Membro para outro.

O Advogado-Geral refere ainda o Acórdão proferido no processo Dzodzi onde o TJUE examinou um caso em que o direito nacional tinha alargado a aplicação das regras do mercado interno da União a situações meramente internas, a fim de evitar a discriminação inversa. Neste caso, o TJUE declarou que não impede os Estados‑Membros de o fazerem. Nestas condições, o Tribunal de Justiça respondeu às questões submetidas a fim de assegurar a interpretação uniforme do direito da União.

As Conclusões podem ser consultadas na íntegra aqui.

8.Comunicado da Comissão Nacional de Proteção de Dados (“CNPD”) sobre a Worldcoin, de 8 de março

Na sequência das denúncias recebidas sobre as condições concretas em que estão a ser recolhidos dados biométricos em Portugal, incluindo de menores, a CNPD recomendou os titulares de dados pessoais a ponderar a cedência de dados sensíveis.

Ademais, a CNPD recomenda a não recolha de dados biométricos quanto a menores para garantir a salvaguarda do melhor interesse da criança.

O comunicado pode ser consultado na íntegra aqui.

→ Para mais informações contactar: tiago.s.abade@ccrlegal.pt.

Digital

1.Relatório do Parlamento Europeu relativo à proposta de Regulamento do Euro Digital

Foi publicado, pela Comissão dos Assuntos Económicos e Monetários do Parlamento Europeu, um relatório relativo aos desenvolvimentos da proposta para um Regulamento do Euro Digital. Em causa está a discussão sobre uma forma digital de moeda, a emitir pelo Banco Central Europeu, com o objetivo de assegurar maior facilidade e segurança no pagamento de bens e serviços, através de meios eletrónicos.

O relatório publicado pelo Parlamento Europeu focou-se, essencialmente, na definição dos conceitos relativos a moeda digital e serviços relacionados com a disponibilização da mesma, atribuindo ainda ao Banco Central Europeu competências no âmbito da emissão da moeda e interfaces para a sua utilização.

O relatório pode ser consultado aqui.

2.Relatório do Parlamento Europeu sobre Diretiva relativa à adoção de novas regras em matéria de responsabilidade civil extracontratual em matéria de inteligência artificial

No seguimento da proposta apresentada pela Comissão Europeia para uma Diretiva relativa à adoção de novas regras em matéria de responsabilidade civil extracontratual em matéria de inteligência artificial, o Parlamento Europeu publicou um relatório com a sua análise preliminar.

Neste âmbito, as principais questões identificadas pelo Parlamento e pela Comissão, na sua avaliação de impacto, estão relacionadas com a atual incerteza jurídica, fragmentação na legislação nacional dos Estados Membros, e possíveis situações em que não é atribuída uma indemnização devido à aplicação da lei do Estado Membro.

Considerando os objetivos gerais de harmonização para diminuição de entraves à circulação de serviços e contribuição para um ecossistema de confiança em produtos de inteligência artificial, o Parlamento conclui que a avaliação levada a cabo pela Comissão devia considerar a adequação das opções de política demonstradas, sendo necessário ter em conta as Better Regulation Guidelines.

O relatório pode ser consultado aqui.

3.Aplicação das obrigações do Regulamento dos Mercados Digitais às plataformas controladoras de acesso

Seis meses depois da designação, pela Comissão Europeia, de 6 (seis) entidades controladoras de acesso a mercados digitais, ao abrigo do Regulamento dos Mercados Digitais, todas as obrigações no âmbito deste regulamento passam a aplicar-se, desde o dia 7 de março, às seguintes entidades: Apple, Alphabet, Meta, Amazon, Microsoft e ByteDance.

Depois da apresentação de relatórios de compliance, as entidades em causa estão agora proibidas de adotar determinados comportamentos que ponham em causa os utilizadores finais de serviços digitais, tais como a promoção excessiva dos próprios produtos, limitações de métodos de pagamento, reutilização de dados pessoais recolhidos noutro serviço, imposição de condições desleais a utilizadores profissionais ou pré-instalação de aplicações informáticas, etc.

Pode ser consultada mais informação aqui.

4.Retificação do Regulamento (UE) 2020/1783 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2020, relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros no domínio da obtenção de prova em matéria civil ou comercial (obtenção de prova)

No dia 7 de março foi publicada uma Retificação do Regulamento (UE) 2020/1783 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2020, relativo à cooperação entre os tribunais dos Estados-Membros no domínio da obtenção de prova em matéria civil ou comercial (obtenção de prova).

O texto da Retificação pode ser consultado aqui.

→ Para mais informações contactar: catarina.matias.mascarenhas@ccrlegal.pt.



As informações acima não pretendem ser uma análise exaustiva à totalidade das alterações legislativas e jurisprudenciais, mas uma seleção daquelas que a CCR Legal entende serem as mais relevantes, e não dispensam a consulta da CCR Legal e/ou diplomas às quais as mesmas se referem.