Resumo
Um ano após a publicação da Lei n.º 89/2017, de 21 de agosto, que aprovou o regime jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo (o “RCBE”), foi recentemente publicada a sua regulamentação através da Portaria n.º 233/2018, de 21 de agosto, (a “Portaria”) que entra em vigor a 1 de outubro de 2018. Parcialmente de acesso público, do RCBE constará um alargado conjunto de elementos de identificação da(s) pessoa(s) singular(es) que, direta ou indiretamente, sejam proprietários ou tenham o controlo efetivo das entidades sujeitas ao RCBE. A Portaria recentemente publicada especifica as formalidades a que estão obrigadas as entidades sujeitas ao RCBE de forma a garantir o integral cumprimento dos deveres estabelecidos naquele regime jurídico.
Quem está sujeito?
Estão sujeitas ao cumprimento dos deveres estabelecidos no regime jurídico do RCBE, entre outras:
- Sociedades comerciais, associações, cooperativas, fundações e representações permanentes de pessoas coletivas internacionais (e.g. sucursais);
- Instrumentos de gestão fiduciária registados na Zona Franca da Madeira (trusts), sucursais financeiras exteriores registadas na Zona Franca da Madeira; e
- Fundos fiduciários e os outros centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica com uma estrutura ou funções similares (dentro de certas condições previstas no diploma).
Encontram-se excluídas do âmbito de aplicação deste regime, entre outras:
- Sociedades com ações admitidas à negociação em mercado regulamentado (sujeitas a certos requisitos de divulgação de informação);
- Consórcios e agrupamentos complementares de empresas;
- Condomínios, quanto a edifícios ou a conjuntos de edifícios que se encontrem constituídos em propriedade horizontal (sujeito aos requisitos previstos no diploma).
Quem é considerado o Beneficiário Efetivo?
Consideram-se beneficiários efetivos das entidades societárias (quando não sejam sociedades com ações admitidas à negociação em mercado regulamentado, sujeitas a certos requisitos de divulgação de informação), as seguintes pessoas:
- A pessoa ou pessoas singulares que, em última instância, detêm a propriedade ou o controlo, direto ou indireto, de uma percentagem suficiente (25% no caso das entidades societárias) de ações ou dos direitos de voto ou de participação no capital de uma pessoa coletiva;
- A pessoa ou pessoas singulares que exercem controlo por outros meios sobre essa pessoa coletiva;
- A pessoa ou pessoas singulares que detêm a direção de topo, se não tiver sido identificada nenhuma pessoa nos termos das alíneas anteriores; ou se subsistirem dúvidas de que a pessoa ou pessoas identificadas sejam os beneficiários efetivos.
São igualmente estabelecidos um alargado conjunto de critérios indiretos que as entidades obrigadas ao cumprimento dos deveres estabelecidos no regime jurídico do RCBE (ver Quem está sujeito) deverão seguir de modo a aferir da qualidade de beneficiário efetivo quando o cliente for uma entidade societária.
Caso se trate de um fundo fiduciário, consideram-se beneficiários efetivos, i) o fundador (settlor); ii) o administrador ou administradores fiduciários (trustees) de fundos fiduciários; iii) o curador, se aplicável; iv) os beneficiários ou, se os mesmos não tiverem ainda sido determinados, a categoria de pessoas em cujo interesse principal o fundo fiduciário (trust) foi constituído ou exerce a sua atividade; v) qualquer pessoa que detenha o controlo final do fundo.
Quando se trate de pessoas coletivas de natureza não societária, (como as fundações), ou de centros de interesses coletivos sem personalidade jurídica de natureza análoga a fundos fiduciários (trusts), consideram-se beneficiários efetivos a pessoa ou pessoas singulares com posições equivalentes ou similares às mencionadas para os fundos fiduciários.
O que declarar?
Todas as entidades sujeitas ao RCBE terão o dever de declarar informação suficiente, exata e atual sobre os seus beneficiários efetivos, todas as circunstâncias indiciadoras dessa qualidade (as quais serão incluídas no mencionado formulário eletrónico) e a informação sobre o interesse económico nelas detido.
Esta obrigação declarativa implica, designadamente, a identificação de (i) titulares do capital social de sociedades comerciais, identificando as respetivas participações sociais; (ii) gerentes, administradores, ou quem exerça a gestão ou a administração da entidade sujeita ao RCBE; e (iii) os beneficiários efetivos. Existem ainda informações específicas que deverão ser prestadas conforme a entidade em causa.
Como declarar?
Através de um formulário eletrónico a disponibilizar no website oficial da área da Justiça do Governo.
Qual é o custo?
A declaração não tem custo quando realizada online. Quando for realizada de forma assistida por oficial de registo a declaração tem um custo de 15 euros.
Há igualmente outros custos a ter em consideração:
- Pela emissão de comprovativo de declaração no RCBE — € 20
- Pelo acesso eletrónico à informação do RCBE (assinatura mensal) — € 50.
Quando declarar?
Relativamente à obrigação de declaração teremos dois regimes a funcionar de forma diferenciada até à harmonização dos procedimentos a 30 de junho de 2019: i) o regime aplicável às sociedades constituídas após a entrada em vigor da Portaria (1 de outubro de 2018) e, ii) o regime aplicável às sociedades constituídas antes da entrada em vigor da Portaria.
As sociedades constituídas após a entrada em vigor da Portaria, deverão proceder à declaração do beneficiário efetivo até 30 dias após a sua constituição por um dos meios legais previstos: através do preenchimento assistido num serviço do Instituto dos Registos e Notariado (por marcação) ou, diretamente, através do preenchimento do formulário online.
Estas empresas deverão manter os dados atualizados pelo que, caso haja alteração do beneficiário efetivo, deverão num prazo de 30 dias proceder à respetiva atualização dos elementos da declaração.
Quanto às empresas constituídas antes de 1 de outubro de 2018, a obrigação de submissão da declaração inicial terá uma aplicação faseada. A primeira fase terá o seu início em 1 de janeiro de 2019 e terminará nas seguintes datas:
- Até 30 de abril de 2019, para as entidades sujeitas a registo comercial (e.g. sociedades comerciais e representações permanentes de pessoas coletivas internacionais, tais como sucursais); e,
- Até 30 de junho de 2019, para as demais entidades sujeitas ao RCBE.
As atualizações à informação previamente declarada deverão ser apresentadas no mais curto prazo possível, sem nunca exceder 30 dias contados a partir da data do facto que determina a alteração.
A apresentação da declaração inicial e subsequentes dentro do prazo legal está isenta de custos administrativos.
Quem é o responsável pela declaração?
A responsabilidade da entrega desta declaração é dos órgãos de administração, no entanto informação poderá também ser submetida por pessoas que se apresentem como representantes das entidades: advogados, notários, solicitadores e contabilistas certificados.
Que informação que deverá ser submetida relativa aos beneficiários?
Quando a entidade ou os titulares de participações sociais forem pessoas coletivas deverá ser submetido um vasto conjunto de informação, nomeadamente: o NIPC ou número de identificação estrangeiro, em conjunto com a sua firma, natureza jurídica, sede social, CAE, identificador único de entidades jurídicas, quando aplicável, e o endereço eletrónico institucional.
Quando o beneficiário efetivo for pessoa singular, será necessário igualmente um vasto conjunto de elementos, nomeadamente: nome, a data de nascimento, a naturalidade, a nacionalidade ou as nacionalidades, a morada completa de residência permanente, incluindo o país, os dados do documento de identificação, o NIF, quando aplicável, e, tratando-se de cidadão estrangeiro, o NIF emitido pelas autoridades competentes do Estado, ou dos Estados, da sua nacionalidade, ou número equivalente e o endereço eletrónico de contacto, quando exista.
Alertamos que sempre que a pessoa ou as pessoas indicadas como beneficiários efetivos sejam não residentes em Portugal, deve adicionalmente ser identificado o seu representante fiscal, caso exista, com o nome, a morada completa e o NIF.
Que informação deverá ser submetida pelo responsável da declaração?
Além do beneficiário, o responsável da declaração também deverá ser submetido um alargado conjunto de elementos, nomeadamente: nome, morada completa de residência permanente ou do domicílio profissional, incluindo o país, os dados do documento de identificação ou da cédula profissional e o NIF, quando aplicável.
Que informação será de acesso público (embora restrito)?
Em relação ao beneficiário efetivo, o seu nome, mês e ano de nascimento, nacionalidade, país de residência e interesse económico detido.
Só poderá aceder a esta informação o interessado que se autentique com meio de autenticação seguro, ou seja, entre outros, cartão do cidadão, chave móvel digital, certificado de autenticação profissional, no caso dos advogados, notários e solicitadores e, sistema de autenticação da AT, no caso dos contabilistas certificados.
É possível restringir o acesso à informação sobre o beneficiário efetivo?
Sim. Apesar de ser uma matéria que obriga a fundamentação, é possível requerer a restrição total ou parcial quando se verifique que a sua divulgação é suscetível de expor a pessoa ao risco de fraude, rapto, extorsão, violência ou intimidação, ou se o beneficiário efetivo for menor ou incapaz. É uma matéria de análise jurídica que obriga a avaliação da situação específica do requerente.
Anualmente deverá ser realizada alguma atualização da declaração?
Sim, anualmente deverá ser confirmada a informação anteriormente comunicada. Esta confirmação deverá ser apresentada conjuntamente com a IES.
Há no entanto uma exceção prevista para o ano de 2019 com a dispensa das entidades abrangidas de apresentar a declaração anual de confirmação, sem prejuízo (sempre) da eventual necessidade de atualização das informações comunicadas na declaração inicial.
Como confirmar e aceder à informação?
A declaração, uma vez submetida e validada, irá dar origem à emissão de um comprovativo que poderá ser consultado online através de um código de acesso. O registo permite um acesso à informação relacionada com a declaração submetida que será também de acesso público através da autenticação do interessado com meios de autenticação segura (de acordo com os requisitos exigidos pelo sistema informático de suporte ao RCBE).
Que sucede se houver incumprimento pela entidade sujeita ao RCBE?
O incumprimento por parte das entidades sujeitas ao RCBE de manutenção de um registo interno atualizado dos elementos de identificação dos detentores diretos ou indiretos do seu capital social e do controlo efetivo da entidade constitui contraordenação punível com coima de 1.000,00 EUR a 50.000,00 EUR.
Sem prejuízo da contraordenação, enquanto se verificar o incumprimento, é vedado à respetiva entidade:
- distribuir lucros do exercício ou fazer adiantamentos sobre lucros no decurso do exercício
- celebrar contratos de fornecimentos, empreitadas de obras públicas ou aquisição de serviços e bens com o Estado, bem como renovar o prazo dos contratos já existentes
- concorrer à concessão de serviços públicos
- admitir à negociação em mercado regulamentado instrumentos financeiros representativos do seu capital social ou nele convertíveis
- lançar ofertas públicas de distribuição de quaisquer instrumentos financeiros por si emitidos
- beneficiar dos apoios de fundos europeus estruturais e de investimento e públicos
- intervir como parte em qualquer negócio que tenha por objeto a transmissão da propriedade, a título oneroso ou gratuito, ou a constituição, aquisição ou alienação de quaisquer outros direitos reais de gozo ou de garantia sobre quaisquer bens imóveis.
Quais as obrigações dos sócios das entidades abrangidas e consequências do incumprimento?
De forma a que as entidades possam cumprir com as suas obrigações declarativas, o regime legal do RCBE prevê ainda um conjunto de obrigações dirigidas aos sócios das entidades sujeitas, os quais devem comunicar os elementos de identificação referentes aos seus beneficiários efetivos, e informar qualquer alteração aos seus elementos de identificação, no prazo de 15 dias a contar da data da alteração relevante.
Se, no prazo de 10 dias a contar da notificação da sociedade aos sócios incumpridores, estes não cumprirem o dever de informação ou não justificarem a razão do incumprimento, a sociedade poderá proceder à amortização das respetivas participações sociais.
Para mais informações contacte:
Partilhe
|